Uma espécie de queixume zangado

Já se devem ter perguntado, ou não, como correu o meu Outubro sem compras (de coisas novas, excluindo cosméticos, produtos de higiene, comida, roupa para miúdas e prendas). Já estive para vos vir cá contar da desgraça, mas tive vergonha. Digamos que correu tudo muito bem durante duas semanas, depois esqueci-me. Foi tão simples quanto isso. Esqueci-me. Nem os e-mails regulares que recebia do Buy Nothing New Month a relembrar-me fizeram efeito, porque a falta da preparação necessária para levar a cabo um empreendimento destes fez com que tomasse as decisões de comprar sem pensar a priori. Tive de comprar uma série de coisas para a casa e para as miúdas, e não me lembrei uma única vez de as procurar em segunda mão. Uma vez lembrei-me, mas onde ia eu encontrar feltro em segunda mão? Não comprei os fatos do Halloween, fi-los eu, é certo (e foram um sucesso!), mas precisei de comprar feltro, tule e umas bandoletes para pôr as orelhas. Se podia tê-las procurado na Internet, nos grupos de troca do Facebook? Podia. Mas, morando em Sesimbra, será que me ia mesmo deslocar até Lisboa ou outra cidade para ir buscar dois aros de bandolete usados? E os gases emitidos pelo automóvel nessa deslocação? E o tempo que perco e/ou roubo à família? A mim parece-me que todo este esforço roça o ridículo.

Pergunto-me como fazem aquelas pessoas dos blogues que passam um ano sem compras. Não quero acreditar que fazem batota, mas, caramba, é difícil como o raio. E desmotivante. Porque as grandes superfícies fazem 50% de desconto na aveia embalada e nós somos grandes consumidores de aveia. Porque o preço de certas coisas a granel (e da aveia comparada com a promoção) na única loja de produtos a granel que conheço na zona é absurdo. São produtos biológicos, podem dizer. Mas quando é que os produtos biológicos passam a ter preços mais acessíveis à carteira de todos? Assim como também é desmotivante, para terminar o rol de queixas, o preço justo, está certo, mas incrivelmente caro destas calças de ganga feitas à mão por uma empresa nacional. Por muito que eu queira, nunca vou ter dinheiro para comprar umas destas.

E é assim que termina um mês de reflexão sobre o consumo: a maioria das pessoas não tem dinheiro para sequer se dar ao luxo de pensar em quem é que faz a sua roupa, os seus brinquedos, as suas bolas de Natal. E tenho cá para mim que a minoria que tem dinheiro também não se preocupa muito. Mas não vale a pena vermos documentários destes se depois continuamos todos na mesma.

(Ainda não percebi se me estou a queixar, se é um apelo à acção. Também não está ali no meio. É melhor decidirem vocês.)

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Outubro de mudança

Chegámos a uma altura em que já deixámos de ter poder de escolha sobre a quantidade de lixo que trazemos para casa. O lixo é-nos imposto, quer queiramos quer não, como complemento indissociável dos produtos que compramos. Reduzir o lixo que produzimos é uma autêntica luta diária que exige preparação e antecipação, paciência e diplomacia. Sinto como se me tivesse de preparar para uma guerra e munir-me de capacete, colete à prova de balas e metralhadora antes de sair e enfrentar o mundo do comércio e os vendedores que nos impingem e os compradores que aceitam sem pensar os produtos descartáveis.

Se levo as minhas próprias embalagens para a casa da comida pronta, o senhor quase que se zanga comigo. “Mas o que é isto, menina? Nós temos embalagens nossas!” Respondo que bem sei, senhor, e são embalagens muito resistentes, mas estou a tentar produzir menos lixo, sabe, ao que ele responde “Pff, se é assim que quer!”, como se me estivesse a fazer mal a mim própria, uma tonta que não sabe o que faz.

Se no talho tento recusar o segundo saco de plástico (a carne é colocada num saco de plástico que é colocado dentro de outro saco de plástico), a senhora responde com um tom maternal “Deixe estar menina, mais saco menos saco…”, como se me estivesse a fazer um favor, como se fosse um acto generoso da sua parte dar-me mais outro saco, não vá eu sujar o banco do carro. Resisto a ripostar. A carne já está dentro do saco, que já está dentro de outro saco, e se a obrigar a retirar o segundo saco, o mais certo é ir parar ao lixo, sem ser usado, porque já esteve em contacto com a carne e a Asae é que manda.

Sem falar noutro tipo de lixo que nos é impingido, como é o caso dos 198 canais de televisão, da fibra óptica, dos 3 gigas e das operadoras a lutar entre si por mais clientes. Optámos recentemente por um pacote com menos canais, mas com mais dados no telemóvel e foi uma complicação explicar ao rapaz porque é que 33 canais até já são demais para quem praticamente não liga a televisão. Mas e as meninas? Não acha que elas devem ver mais do que apenas dois canais infantis? Pois… não. É que nós preferimos que elas brinquem, sabe. E quase me desfaço em desculpas.

É cansativo.

Ainda assim, acho que vou insistir nisto. Vem aí Outubro, o mês sem compras de produtos novos, e se noutros anos só me lembrava a meio, este ano ainda vou a tempo de decidir não comprar nada novo durante 30 dias. Não é muito. Aliás, não é nada. Desde que, em Abril, decidi que ia passar a ter mais atenção à roupa que compro (onde e em que condições foi feita, preferindo produção nacional, local e até caseira), que me tenho portado muito bem. Tive um ou outro deslize, confesso, mas posso dizer que comprei apenas 5 peças de roupa nova, sendo apenas uma de produção fora de Portugal. Valeu-me o guarda-roupa que herdei da minha avó e que fui arranjando ou mandando arranjar, valendo-me várias saias e vestidos para o Verão que passou. Fora isso, não tenho por hábito comprar bijuteria, nem acessórios (comprei uma mala que mandei fazer com um tecido meu, portanto sei bem quem a fez e paguei o preço justo por ela), nem sapatos e as minhas compras por impulso também são cada vez menos. A minha única perdição são os livros, mas acho que tenho livros novos que cheguem durante um mês. Portanto, não, não vou precisar de comprar nada novo para mim. Excluem-se os produtos de higiene e limpeza da casa, alimentação e prendas, no caso de me ser mesmo impossível fazê-las eu. Exclui-se também o resto do agregado familiar. Essa é outra luta que espero travar dando o exemplo.

Posto isto, Outubro é capaz de ser um bom mês de teste para implementar algumas mudanças. Será que sei no que me vou meter?

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