Há uns meses, andava com uma dor de costas e fui fazer uma massagem. A massagista, que por sinal também fazia acupuntura e me avaliou a condição física à luz da medicina chinesa, disse-me que andava a guardar muita coisa no fígado e mandou-me fazer manualidades. Parece que o fígado precisa de momentos criativos quando anda mal dos humores.
Não lhe liguei muito (nem à acupunturista nem ao fígado), mas quis o destino que os assuntos hepáticos viessem várias vezes à baila nos tempos que se seguiram.
Hoje, ao levantar-me da cama depois de uma noite muito mal dormida, pus-me zangada com o mundo e assim me deixei ficar até a tarde já ir bem entrada. Lembrando-me do que a acupunturista me tinha dito, que a raiva se acumula no fígado e que, para a contrabalançar, temos de dar asas à criatividade, fui, mais por desespero de causa do que outra coisa, buscar um projeto faça-você-mesmo por terminar e dediquei-me à sua finalização. Ouvi um podcast inteiro enquanto acabava de fazer upcycling ao candeeiro do nosso quarto e, depois de o pendurar e concluir que até ficou giro, fui para a cozinha fazer o jantar. Tinha comprado, ao preço do ouro, uns lombos de salmão e fi-los como sempre os faço, que é em papelotes, com alho francês, cebola e tomate. Enquanto coziam, fiz esparregado e improvisei uma sopa de couve-flor, mas sem ser em creme, que as miúdas não gostam de sopa passada (mas também não gostam de couve-flor, como bem me recordaram depois). Pus a mesa lá fora, fui buscar os pratos da Bordalo e até os talheres do peixe, como as pessoas chiques.
Quando nos sentámos à mesa, percebi que tinha recuperado a boa disposição. Não sei se foi das manualidades, se foi porque o jantar até nem estava mau e a sopa foi elogiada pelo outro adulto, o certo é que tanto eu como o meu fígado ficámos mais apaziguados.
Esta noite havemos de dormir bem.