Meu querido mês de janeiro

Tenho a sensação de que nos primeiros quinze dias deste ano couberam dois meses inteiros. Janeiro costuma ser um mês calmo, tanto na vida como nos negócios, em que me arrasto sem dinheiro nem energia, mortinha que acabe. Talvez tenha sido manifestação minha, quando decidi passar as doze badaladas dentro de água (quem me mandou agitar as águas? Pun intended), mas este janeiro está a compensar toda a ausência de adrenalina de que me queixei nos dez janeiros anteriores. Ora, vejamos:

  • Fui a banhos no dia 1 e decidi aderir ao Dry January e não tocar numa pinga de álcool durante todo o mês. Quem me conhece ou é leitor deste blog desde a pandemia sabe que, para mim, estar um mês sem um copo de vinho está na categoria do altamente improvável, mas, ei, já passaram duas semanas e ainda não prevariquei nem deixei de conviver para evitar tentações. Estou uma crescida.
  • O meu último post do ano passado refletia o meu estado de inquietação com um caroço que descobri na mama, antes do Natal. Foram dias de muita agitação interior antes de ter a confirmação de que não é maligno, mas é preciso vigiar e, talvez, remover. Eu bem pedia saúde… Não querendo desvalorizar isto, também não lhe quero dar demasiada importância, é uma coisa de família, a minha mãe tirou três, todos benignos, e, portanto, comigo também vai correr tudo bem. É isso. Adiante, que ainda só vamos no dia 5.
  • Chateei-me a sério com uma amiga, ou uma amiga chateou-se a sério comigo, e a série de emoções que isto desencadeou em mim é mais inquietante do que a lista de ingredientes de um pacote de gomas.
  • Li o Águas Passadas, do João Tordo, e estou quase a acabar o esquecidos de domingo, de Valerie Perrin. O meu desafio de leitura para este ano está nuns modestos 35, o que, se para uns é muito, para outros é leitura de fim de semana…
  • Tenho um relógio novo daqueles que medem tudo e um par de botas e até me dizem como dormi, como se eu não soubesse que ter boas noites de sono nunca foi o meu forte.
  • Arranjei um grupo com quem fazer a Travessia da Baía e treinar para. Natação em águas abertas vai passar a ser a minha nova modalidade no meu novo relógio. E na minha vida.
  • Descobri a Audrey e, de repente, conjugar riscas com bolas deixou de ser assim tão disparatado e misturar vermelho com cor de rosa e verde passou a ser apetecível. Além disso, quero aquele papel de parede.
  • aqui confessei a minha crush intelectual pelo Andrew Huberman. É o podcast que mais oiço, embora o Spotify diga que é o do Rich Roll. É fácil perceber o equívoco: é que o do Huberman, não oiço no Spotify, vejo no YouTube, porque gosto de olhar para ele (risinhos). Entretanto, descobri que há isto para relaxar ao som da sua voz e, olhem, nem sei que vos diga.
  • Apesar de o Spotify me ter dito que, o ano passado, ouvi mais música eletrónica do que qualquer outro género, o meu estado contemplativo do final de ano fez-me voltar à música melancólica. Esta ainda toca em repeat:

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Inventário

Janeiro longo, com mais braços do que um polvo, já ficou lá atrás. Entrámos em fevereiro com um teste positivo à covid. Mais sete dias de isolamento, que, só por si, nem são muitos, mas se lhes acrescentarmos todos os dias que vivemos isolados nos últimos dois anos, perdemos a conta ao desespero. «Farta desta merda», como diz nos bordados do Hardcore Fofo, que um dia ainda hei de comprar e vestir, orgulhosa, em  jeito de protesto silencioso e sem destinatário específico.

Os dias em isolamento sucedem-se sem novidade nem vontade. Faço autotestes por recreação. Leio muito pouco. Obrigo-me a jogar Monopólio e a fingir que gosto. Penso muitas vezes em escrever, mas o único diário que mantenho é o do sono, que já me permitiu chegar à bela conclusão de que nunca duvidei: durmo mal e não creio que haja muito a fazer sem químicos. Mas lá vou tentando com coisas naturais, mais que não seja para, um dia, poder dizer que tentei.

Mas não foi um mês perdido. É verdade que não cumpri escrupulosamente tudo aquilo a que me propus, mas, dado tudo o que podia não ter feito, acho que fui relativamente bem-sucedida em algumas áreas. Por exemplo, não fiz 30 dias de Yoga with Adriene, mas fiz 20. Caramba, 20 dias de ioga num mês! Nem quando estava inscrita duas vezes por semana eu fazia tanto ioga! Depois, fiz batota no Dry January e bebi aos fins de semana, mas de forma consciente, e só bebi 5 vezes em 31 dias. Nada mau. Também não comecei nenhuma dieta, mas deixei de comer pão branco e outras coisas à base de farinhas, obrigo-me a beber, pelo menos, litro e meio de água, e isto, só por si, ajudou-me a perder aquele excesso do final do ano sem sacrifício. Voltei a costurar, mesmo que me tenha ficado pelos guardanapos de pano e por uns quadrados para a manta de retalhos que vou fazer um dia. Aconteceram mais coisas, mas receio que este não seja o sítio.

Para fevereiro não sei o que quero. Sair de isolamento era bom. Acordar e perceber que o Chega ser o terceiro partido com maior assento parlamentar não tinha passado de um sonho mau seria espetacular. E saber quem foram os 77 paspalhos que votaram neles na minha secção de voto também dava jeito, porque a terra é pequena e de certeza que me cruzo com com um ou outro diariamente e até lhes digo bom dia.

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Dia de Ano Novo

Em miúda, o dia de Ano Novo era vivido com pompa e circunstância. A minha mãe comprava-me sempre dois conjuntos de roupa nova, um para usar no dia de Natal, o outro, no primeiro dia do ano. Vestidos a preceito, íamos almoçar fora. O restaurante era sempre diferente. Lembro-me de irmos à sopa da pedra a Almeirim e, noutro ano, a Peniche. Chegávamos à uma da tarde, que é a hora a que se almoça. Nós e mais 300 pessoas. Quanto maior a fila, melhor, porque era sinal de que o restaurante era dos bons. É claro que nunca fazíamos reserva. Não sei se não havia ainda esse conceito, se eram os meus pais que, de ano para ano, não aprendiam. Por isso, esperávamos sempre entre uma a duas horas, em pé, no passeio, chovesse ou fizesse sol. (Curiosamente, não me lembro de nenhum 1 de janeiro em que tivéssemos estado à espera à chuva; talvez nos dias chuvosos, os meus pais decidissem almoçar em casa.) Por volta das três da tarde, lá nos sentavam, e atacávamos com sofreguidão o pão com manteiga e as azeitonas. Tirando a sopa da pedra, não me lembro das refeições propriamente ditas. Só me lembro de que, quando saíamos do restaurante, mal tínhamos tempo para dar a voltinha dos tristes antes de começar a escurecer e serem horas de voltar para casa.

Hoje em dia, ano novo sim, ano novo não, passo-o entre o sofá e a sanita, vergada pela ressaca. É triste chegar a esta idade e ainda ser apanhada em falso. Confio sempre na sorte, mesmo já sabendo o que a casa gasta (que não conheço mais ninguém com ressacas como as minhas). Como os meus pais que nunca aprenderam a reservar mesa, também eu ainda não aprendi a beber, se é que posso comparar. Ao menos, eles aproveitavam o dia. Já eu… bom, digamos que o meu ano começou no dia 2. E  pronto, se dúvidas houvesse, agora estou mais do que convencida de está na altura de fazer o Dry January.

Bom ano!

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