É véspera de Natal.
As desvantagens de fazer a consoada na nossa casa é o trabalho que se tem e o dinheiro que se gasta. Mas o trabalho equilibra-se com a seleção do menu à nossa medida (vetei o Bacalhau com Todos) e com a estreia de roupa que não envolva necessariamente golas altas e forros polares, porque, cá em casa, sei que não vou ter frio. Já estive, assim, de vestido primaveril, a engomar a toalha de Natal, que a minha mãe bordou e me deu uns quantos Natais atrás, e os guardanapos de pano. O meu sentido, no entanto, está todo na Olívia, a nossa gata, que não vem dormir a casa há duas noites. Nunca pensei voltar a passar por isto, não com ela, que era tão caseirinha. Acho que alguém a levou, mas não quero pensar que, para fazerem o Natal feliz a uma criança, estragam o Natal a outras duas. Prefiro acreditar que ela foi só namorar, ou que ficou fechada numa garagem e que, não tarda, hão de dar por ela. Já afixámos cartazes, já pus anúncios, já contactei as associações da zona. Dou várias voltas pelas redondezas ao longo do dia e, de galochas calçadas, já me enfiei no caniçal em frente à casa. De carro, olho para as bermas, para a beira do lixo, ao lado dos contentores. Sei que isto pode não ter um final feliz.
É claro que, às pessoas, apetece-me fazer ghosting. Porque há sempre tantos julgamentos quando um animal se perde ou se magoa, sempre tantas acusações contra os donos que os deixam viver livres, que se recusam a prender gatos em casas nas quais as portas estão quase sempre abertas e nas quais, para que os donos possam entrar e sair como lhes aprouver, seria necessário fechar os animais em quartos, em jaulas. Sempre soube que era um risco que corria, já perdi uma gata assim. Então, e não aprendeste? E as pessoas, quando é que aprendem a meter-se na sua vida? Talvez o Pai Natal lhes dê um pouco de capacidade de não julgamento no sapatinho. Quanto a mim, para o Natal, só quero a minha gata de volta, não há prendas nem banquetes nem vinho que me consigam amenizar a angústia.
Agora, vou comer uma filhós. Só para não sentir que me falta tudo.