Fazer coisas difíceis

O Arnold Schwarzenegger diz “Through comfort no one ever grows” (diz aqui e aqui, mas vale a pena ouvir as duas entrevistas, porque, além de ainda manter o delicioso sotaque alemão, não obstante as décadas que já está nos EUA, a abordagem em cada um dos podcasts é completamente diferente e não ficamos com a sensação de que se repete).

Tem sido mais ou menos esse o meu lema este ano, embora só agora me tenha apercebido disso. Tenho andado a fazer coisas difíceis atrás de coisas difíceis e a sentir que cresço de cada vez que dou um desafio por concluído.

Era mais ou menos isso em que pensava, hoje de manhã, no barco, quando desconfiei da minha capacidade para me desenvencilhar no mergulho, agora que já acabei o curso e não tenho o instrutor para me safar da atrapalhação. Decidi que não podia esperar muito tempo para me meter no mar depois de acabar o curso, pois isto agora requer prática e não posso permitir que o medo se instale outra vez. Então, ontem, telefonei para o centro e perguntei se, no fim de semana, tinham algum mergulho adequado a principiantes. O rapaz foi muito simpático e profissional, mas aposto que se riu para dentro, pois não há cá isto de mergulhos para principiantes. Não dão o certificado se não acharem que a pessoa está preparada e, depois disso, é completamente indiferente mergulhar a 12 ou a 18 m. A diferença só está na nossa cabeça. Temos sempre de subir devagar, por isso ou sabes ou não sabes e, se não sabes, não vais.

Então, eu fui – eu, o guia e mais três pessoas que conheci no barco. Meti conversa com o buddy que me foi atribuído, para perceber o quão experiente era. Sorte a minha, começou a mergulhar com o pai em pequeno e tinha cabedal para carregar comigo caso a coisa desse para o torto. Fiquei confiante.

O mergulho em si foi merdoso. Havia muita corrente, o que nos fez andar às voltas sempre no mesmo sítio, e a fauna decidiu esconder-se de nós. Vimos um polvo, enfiado na sua cova, uns cardumes de salemas e uma parede com peixinhos roxos e amarelos minúsculos, e pouco mais. Mas foram 54 minutos nos quais eu: a) não andei a arrastar com a barriga no chão; b) não atrasei ninguém; c) nunca entrei em pânico nem fiquei ansiosa; d) tive um consumo eficiente de ar derivado a c); e) consegui manter uma flutuabilidade mais ou menos decente, q.b. para não passar vergonhas; f) subi controladamente e consegui aguentar 3 minutos aos 5 metros com flutuabilidade neutra o que, digo-vos, é mais difícil do que fazer malabarismo com meia dúzia de laranjas… Quando subimos ao barco, vimos golfinhos, e quem é que não gosta de golfinhos, e eu senti aquela satisfação boa de estar viva e ter conseguido – conseguir estar viva, mas principalmente, conseguir, que é um verbo que vale por si só e não precisa de complemento ou regência.

Na semana que entra, vou fazer outra coisa difícil que entra na categoria de desafio pessoal, que é falar num evento público. Vou falar sobre a minha profissão, logo, não há risco de dizer grandes barbaridades. No entanto, não sou uma pessoa muito eloquente nem estruturada e corro o sério risco de não dizer tudo o que quero ou pela ordem que quero. É claro que podia ter recusado o convite, inventado uma desculpa ou simplesmente dito a verdade: não gosto de falar em público. Mas ainda o Arnie não tinha dito aquilo de o conforto não fazer ninguém crescer e já eu pensava nesses termos: e o que é que eu ganho se não for? Ficar em casa, de rabo alapado no sofá, refugiada na familiaridade dos dias?

Estou mortinha de medo de ter o microfone na mão, mas se eu entrar naquele auditório com a atitude com que quero sair, talvez a coisa seja menos dolorosa.

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