Terraços

Viemos a Sintra ver uma tia que já treme muito das mãos, baralha os nomes, mas ainda tem conversa daquela que parece nunca acabar. Receberam-nos na entrada, de onde não passámos. Sempre pensei que as casas de repouso mais condignas tivessem uma espécie de sala de visitas, ou uma marquise onde batessem os últimos raios do sol da tarde. Mas não foi o caso. Por sorte, antes de lá chegarmos, passámos por um terraço feérico, típico daquela zona, que deve fazer as delícias aos contadores de histórias. Também gostava de ter um terraço assim na minha casa, mas para isso era preciso ter requinte, disponibilidade e dinheiro. Infelizmente, não tenho nenhuma das coisas nas doses necessárias.

Onde moro, as casas não são nada feéricas. São feitas, quadradas e pouco adornadas. Há algumas engraçadas, mas nem sempre pelos melhores motivos. A casa em frente não é das piores, tem um grande jardim com uma romãzeira e uma nespereira, mas as árvores não dão bons frutos e o jardim está sempre descuidado.

Numa destas noites em que me levantei às duas da manhã para vomitar, vi pela janela da casa de banho o vizinho da frente sentado no seu terraço. Não me pareceu que estivesse a beber, ou a fumar, ou a ler ou sequer a olhar para o telemóvel. Estava só ali, às escuras, a olhar para a noite.

Lembrei-me de que não lhe via a família há algum tempo. Percebi que talvez estivesse sozinho e triste. Tive pena dele. Mesmo estando eu naquele momento de vómito na boca, achei que ele estaria bem pior do que eu.

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